segunda-feira, 22 de junho de 2009



PARA QUE ESTE MUNDO NÃO ACABE


segunda-feira, 15 de junho de 2009

Gumbo

Naqueles dias nada era mais importante que os solitários passeios a que o homem se entregava (a obrigação era diária apesar da duração da excursão ser, quase sempre, variável), e dos quais não soubemos nunca nada- apenas 1) a velatura que trazia nos olhos e 2) que o trajecto sempre ia pela água, além da faixa de palmas bravas. Nada, nem os homens agrilhoados, nem a água lambendo a terra, nem a sua história nem a nossa, nada sobre nós era tão importante como aqueles passeios desesperados; os lugares que visitaria, as coisas que não veria, imerso que estava no transe de deambular e dois quais, de qualquer forma, nada saberíamos.
Tudo isto testemunhámos porque uma mulher permaneceu no alpendre. Não esperando o regresso do homem. Simplesmente ali se encontrava, mirando em frente. Talvez curando alguma dor, talvez entregue ao ocioso vazio que depois dela vem, só ali. Olhando em frente, cheirando a comida mas olhando em frente.
Então o homem chamado Gabriel aparecia. E desaparecia, lá para dentro.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Na noite que a serra escande

já só sei dizer nomes próprios. Soletrar. Cantar que os meus estão na rua e ficar-lhes com as pernas maciças. Antão Tomé Joana João. Isto é rezar.



segunda-feira, 8 de junho de 2009

Palmeiras com nomes próprios

 

Uma grave e arguta elucidação em alemão para as massas salvou meu desenho a carvão- explicou-me, quebra por quebra, as tensões circulares a que se ofereceria, antes de tudo, antes do olho. Assim, desde última fila no topo da colina até à boca da ópera (era uma montanha) deixei que ele se fizesse e me entreguei no esforço de acompanhar aquilo que já por si desbravaria (é uma canseira a vocação).


Regressei de trabalho feito para uma montanha vazia, um irmão já crescido, os amigos perdidos.


Louco o homem que trabalhou, que se afincou numa lavra e nessa distância sulcou bem fundo um trabalho, uma obsessão. E agora de trabalho feito, a vida cava no corpo (nas mãos) uma ressaca e o nosso louco declina a sua companhia natural, essa doença, e sai para a costa. Digamos: é a festa do estio.

E se ele raivoso procura desenfreadamente colina acima, colina abaixo, desfazer-se com as marés; beber em quantidades idênticas ao que pensa ser a piscina do mar; correr pelo meio dos cardos, picar-se; deixar, e arrepender-se de ter deixado, o livro à guarda de um carcereiro alimentador de ratas do tamanho de pequenos leõezinhos (que vêm comer à mão dela, que é a prisioneira-mor), é porque chegada a noite ou lá o que é, se deita para dormir e sonha, sonha muito. Que consigo descem pelas encostas todos os queridos, e que ao subir encontra, já sem surpresa, os desaparecidos.


Minha mãe eu

corro.


quinta-feira, 4 de junho de 2009

The slope II

Com que dentes arranhar um novo amor? A pergunta é sempre a mesma, e Maria Teresa maldiz um certo, certeiríssimo amante que do corpo lhe arrancou a luz à bombilhada.

Eu penso nela. O corredor não pensa em nada. Lá dentro um homem -novo- perde a cara, a juventude e quiçá a parca vida.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

"TATU"

É uma casa colonial escabrosamente alçada em dois pisos. A fachada picada e caiada não acusa nenhuma orientação solar (talvez esteja virada a Este), mas antes volta toda a casa no movimento que acompanha um inesperado percurso vulcânico, uma coisa assim muito insular. Dir-se-ia que espera naturalmente uma erupção. Ao olhá-la de cá parece-me compreender o seu projecto e calo creio que obscuramente entendo a tua vontade secreta de uma imobilidade indiferente, para abolir o tempo. Para o esperar. Sem paciência.
Portanto num painel de azulejos mandei inscrever a misteriosa legenda. Agora, como a um medalhão, dedico-me a olvidar o resto e a habitar somente essa legenda com a estranheza da deslocação. Admito que exista, sim, a intenção de um lento cultivo para o delicado desconforto do lar. E talvez com o fim do Verão ele chegue assim, como uma jóia- a ostentação de um quase constante desfasamento.

Faço tudo o que posso para permitir ao longe o restolhar das folhas das palmeiras, umas contra as outras. Quero dizer, faço tudo o que posso para permitir a fúria imobilidade da loucura. E não me referir jamais ao mar.

Agora para dentro. Devagar, depressa e devagar.