Pai, sinto falta da
rédea dura que o teu coração mole nunca arrepiou
áspera, sobre a minha penungem adolescente
essa serpente que lambe,
pata visível por pata (in)visível
os caminhos do transtorno, e trilha
os eixos da carícia desta pele morna, branda, lírica
É uma fonte tantas vezes dourada, que corre a nuca
- uma veneziana-,
e se precipita em cascata
e se enremoínha no templo da cicatriz primordial-
o ponto equidistante entre o atlântico e o pacífico
a mata que fica no meio destas omoplatas
o ponto equidistante entre as omoplatas-
mata desmedida para as minhas costas
meu país horizontes fantasias
mas para a tua cabeça
não.
acende e excende as costas
e depois prossegue
espessando em brandura hacía la curva
até se esconder afilada e sacral
E é ela que se espalha sobre os ombros
como uma chuva dourada
consagra o busto ao brilho
Dulcíssima armadura que distingue
a bandeira/mortalha da indomabilidade da infância
e penteia de serpenteada seara cobrindo toda a super
fície da face, como disse Carlito Azevedo a super
autoestrada da crise mimética, como disse Girard
e espraia ao amor que a mim me anima o ventre, o baixo ventre,
e povoa enfim as províncias do aleitamento
circundando corolas, alinhando em espinha
as mil curvas colunares.
A branda armadura saca os dentes do cão preto da infância
quando lhe bate o sol e ela adensa em brilho como a mata delirante das nossas proibições e o tempo é só isto: dois
cães latindo
a cada extremo da abóboda celeste
assim me perco e me reencontro
assim um espelho e uma pega de caras
assim um guia do vai e vém da cabeça aos pés da deusa,
a penugem da adolescência, pai, passando, passando
abrandando
A rédea que é tanta vez motor inverso do amor morto, pai
da austeridade, do pó branco do recato, do abandono servil
Pai, um freio que chicoteasse atinçando esta babugem
que é já só da raiva o seu caroço negro
Pai, agora sou uma mulher
e sirvo à tua mesa minha melhor perda de rubro,
o vinho doce da nossa fermentação:
duas azeitonas pretas
certamente amargas mas a trituração
delas, pai, na tua recta boca é o alimento
sacia nossa constante fome de desordem, a raia do nosso amadurecimento,
nosso cogitar sossegado.
pink pink pink pink, pink moon
Fazenda, Junho 2012